InVersos: Maria Azenha – Vejo crescer a lua

Chamo-te
tal como outrora:

as raízes das árvores
estão fazendo o inverno numa jaula
debaixo do solo

a que nasceu com um vestido branco de sombra
está sonhando ainda num cavalo de névoa

e o vento chegou com o seu leque de água
no lugar antigo do orvalho
como se estivesse sufocando
para dentro de uma pedra

há um colar de penumbra
enrolado ao pescoço
com frases que rangem no quadrado do quarto
no fundo de um poço

alguém que não conheço e vem do lugar da noite
com escorpiões nos braços
desce as escadas no mistério de uma abelha
no espaço do tronco

vejo crescer a lua
para dentro do cárcere de agosto
com um chapéu de abandono de folhas secas
e parcas

a minha sombra cai dentro da sombra
sem que de si possa lembrar-se

maria azenha

InVersos: Maria Azenha – Quarta Folha – Poema V

Na parede da sala o luar fez descer a sua pequena música
em sereias e medusas no anel branco da noite.
é então que estremece,cintilante na areia,a praia nua
em seus cavalos brancos de sombras e de espuma.

e unindo uma a uma suas crinas de brancura
onde pousam abelhas de prodígio por detrás das dunas
o vento e o mar em vultos me procuram, não se cruzam.
no centro permanecem sem imagem nem colunas.

e espelhos de silêncio e ausência me recusam,
e muros de navios me reflectem e ressoam
na sala atravessada por um fio a prumo,
que corre eternamente para o fim do mundo

maria azenha