A versos eu, convoco quantas vozes
Em gargantas humanas já passaram
Desde o grito, primeiro articulado.
Quando a voz pessoal se vai calar,
Tome lugar o coro no vazio
Da ausência do homem, assinado.
José Saramago
A versos eu, convoco quantas vozes
Em gargantas humanas já passaram
Desde o grito, primeiro articulado.
Quando a voz pessoal se vai calar,
Tome lugar o coro no vazio
Da ausência do homem, assinado.
José Saramago
e morre-se devagar no meu país
as árvores no Outono estão nuas – esquálidas
no Inverno o frio magoa os ossos e a alma
mas talvez os melros cantem antes da próxima primavera
se o verão chegar todos os dias
no sol de uma tigela de sopa fraterna
morre-se devagar no meu país
e depressa tudo se esquece
Piedade Araújo Sol
Amemos! quero de amor
Viver no teu coração!
Sofrer e amar essa dor
Que desmaia de paixão!
Na tu’alma, em teus encantos
E na tua palidez
E nos teus ardentes prantos
Suspirar de languidez!
Quero em teus lábios beber
Os teus amores do céu!
Quero em teu seio morrer
No enlevo do seio teu!
Quero viver d’esperança!
Quero tremer e sentir!
Na tua cheirosa trança
Quero sonhar e dormir!
Vem, anjo, minha donzela,
Minh’alma, meu coração…
Que noite! que noite bela!
Como é doce a viração!
E entre os suspiros do vento,
Da noite ao mole frescor,
Quero viver um momento,
Morrer contigo de amor!
Álvares de Azevedo
A partir do momento em que percebi que tudo morre e acaba,
e que mesmo durando muito, terá fim,
deixei de ter sede em criar.
Escrevo estas palavras na perfeita noção de que serão de existência breve.
Morre o homem, ceifa a vida,
Morre a ideologia, as ideias, as aspirações, os projectos inacabados, as vontades e os desejos.
Morre em silêncio,
às escondidas de um mundo indiferente,
que dói mais por ser indiferente perante a insignificância, que tanto significa, para quem morre.
Verdades absolutas,
sabedorias por partilhar,
palavras por dizer,
mensagens por entregar.
Tudo morre com o morto.
As palavras que aqui deixo, neste texto,
são incompletas,
e assim incompletas vão permanecer.
Potencialidades infinitas,
mundos criados,
universos sonhados,
detalhes e minúcias ainda por ver a luz do dia,
O que poderia vir a ser,
emudecido de um só trago.
O que mais dói é o que não foi.
Saio,
Estas ruas e calçadas deixarão de sentir o peso dos meus pés,
Continuarão sem mim, sem sentir sequer o meu abandono,
Continuarão sem mim, indiferentes, sem nunca sequer me ter sentido.
E eu, deixarei de sentir,
Perco a minha existência,
Cesso de estar,
A banalidade do ciclo vicioso do ser.
Enquanto o universo pisca os olhos.
Bruno Albino